Enfermaria nº 6

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Curiosa a fortuna dessa famosa novela que A. P. Tchekhov escreveu com pouco mais de trinta anos em 1892, sobre o desenrolar da existência de um médico numa cidadezinha remota da antiga Rússia czarista, e suas visitas à Enfermaria nº 6, o pavilhão dos loucos onde ele trabalha enquanto medita sobre a vida e sobre a morte. Quando comparada a quase novela, a brasileira O alienista, que Machado de Assis, com pouco mais de quarenta anos publica em 1881, e ambienta na vila de Itaquaí, do estado do Rio de outrora, as semelhanças chegam a impressionar. Ambas as obras, consideradas pela crítica entre as melhores dos respectivos autores, apesar do desenlace quase oposto (e mesmo assim parecido), têm, entre si, coincidências surpreendentes. Não apenas há uma série de circunstâncias idênticas: ambos os médicos são pessoas bem formadas e dotadas de inteligência incomum; ambos têm um amigo ao qual confiam seus pensamentos; ambos se vêem as voltas com as vicissitudes da alienação humana, da qual acabam sendo presa, consciente ou inconsciente; em ambas as narrativas o grotesco das situações torna-se ferocidade; mas, há inclusive detalhes em comum: é a câmara dos vereadores das duas cidadezinhas que decide quanto aos destinos do hospital e, ao referir-se ao setor dos dementes, é usada uma expressão idêntica, Bastilha! Claro que no ritmo das duas histórias é diferente: rápido, quase frenético, o de Machado, e pausado, quase cíclico o de Tchekhov, combinando com o tom provocativamente satírico do primeiro e o contido, sóbrio, essencial, do segundo, como convém às ponderações sobre o "verdadeiro" sentido da vida. Por paradoxal que este possa ser, sua procura é de uma atualidade extrema e com ela Tchekhov compõe essa pequena obra prima, livro de cabeceira que merece ser lido, como poucos, ao findar-se e ao iniciar-se de cada novo ano.Contos / Literatura Estrangeira